Após o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros importados, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aposta em despertar o patriotismo nacional como resposta à medida adotada pelos EUA e seus aliados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Durante um evento público no Espírito Santo na última sexta-feira (11), o presidente Lula demonstrou essa estratégia ao usar um boné com a frase “O Brasil é dos Brasileiros”, criação do ministro da Secretaria de Comunicação do Planalto, Sidônio Palmeira. Pouco depois, o petista posou para fotos segurando a bandeira nacional, reforçando o apelo à unidade do país.
No discurso, Lula dedicou a maior parte do tempo para criticar a crise gerada pelas sanções americanas. Ele responsabilizou Bolsonaro e o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) pela articulação com o governo Trump, que resultou nas tarifas. Lula afirmou que vai lutar para reverter a taxação, mas avisou que, se ela permanecer, o Brasil aplicará a Lei da Reciprocidade.
“Este país não baixará a cabeça para ninguém. Ninguém porá medo neste país com discurso e com bravata. Eu acho que, nesse aspecto, vamos ter o apoio do povo brasileiro, que não aceita nenhuma provocação”, disse Lula.
Trump, tarifas, Brasil e Bolsonaro
- Trump tem ameaçado o mundo com a imposição de tarifas comerciais, desde o início do mandato, e tem dado atenção especial ao grupo do Brics e ao Brasil.
- O presidente norte-americano chegou a ameaçar taxas de 100% aos países-membros do bloco que não se curvarem aos “interesses comerciais dos EUA”.
- Após sair em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Trump impôs 50% de tarifas sobre exportações brasileiras para os EUA.
- O líder norte-americano alegou que o Brasil não está “sendo bom” para os EUA e afirmou que existe déficit para seu país no comércio bilateral, o que não é verdade.
Mobilização
Enquanto o presidente Lula reforça seu discurso, apoiadores têm impulsionado nas redes sociais uma campanha que busca resgatar símbolos nacionais, como as cores verde e amarelo e a bandeira do Brasil, tentando dissociá-los do bolsonarismo que dominou nos últimos anos.
O Partido dos Trabalhadores (PT) lançou a campanha “Defenda o Brasil”, que enfatiza esses símbolos em suas peças publicitárias e atribui ao ex-presidente Jair Bolsonaro a responsabilidade pela imposição das tarifas anunciadas por Trump. Na sexta-feira (11/7), a hashtag “Bolsonaro taxou o Brasil” esteve entre os temas mais comentados no X.
De acordo com o presidente nacional do PT, senador Humberto Costa (PE), a sigla tem registrado crescimento nas redes sociais, especialmente após a discussão sobre justiça tributária. O partido intensificou suas ações digitais para ocupar um espaço maior no debate público online.
“Desde debater a justiça tributária, tivemos um crescimento nas redes. Com o debate das tarifas, crescemos mais ainda. Estamos conseguindo, depois de muito tempo, um equilíbrio com as redes sociais. A tendência nossa é ocupar mais espaços”, afirma o senador petista.
Humberto Costa ainda complementa destacando o trabalho realizado por Eduardo Bolsonaro junto ao governo norte-americano em busca de sanções às instituições brasileiras.
“Eu acho que tá mal para eles. Na verdade, você ter um cidadão brasileiro que sai do Brasil para pedir que outro país sancione o seu país tá cometendo o crime de lesa-pátria — e a população tá vendo isso”, finaliza o presidente do PT.
O deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP), secretário Nacional de Comunicação da sigla, reforça que a campanha do partido tem como objetivo demonstrar a influência do bolsonarismo na taxação norte-americana, tendo como objetivo chantagear o Poder Judiciário.
“Nosso objetivo é defender o Brasil. Defender nossa indústria. Defender nosso agronegócio. Defender nossa soberania. Essa campanha é para demonstrar que o golpismo do Bolsonaro escalou ao se aliar ao governo dos Estados Unidos para penalizar a população brasileira, com o objetivo de chantagear nosso Judiciário”, pontuou Tatto.
O secretário Nacional de Comunicação do PT destacou, em entrevista ao Metrópoles, que a campanha também denuncia governadores aliados ao ex-presidente que teriam comemorado a sobretaxa imposta por Donald Trump.
“O governo não será o principal atingido por essa taxação, mas sim os trabalhadores nos estados e cidades. Muitos desses locais governados por bolsonaristas que comemoraram a vitória de Trump num primeiro momento e agora comemoram essa chantagem em forma de sanção econômica”, complementa Tatto.
“Inimigo único”
Daniel Dubosselard Zimmermann, professor do MBA Marketing Político e Campanhas Eleitorais da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), avalia que o PT se utiliza da mesma estratégia comunicacional da extrema direita, com a centralização de um “inimigo único”.
“No caso, não é na verdade os Estados Unidos e sim a família Bolsonaro. Bolsonaro e seus partidários utilizaram essa estratégia várias vezes em relação ao Lula e ao PT. E agora o PT está utilizando a mesma estratégia invertendo o discurso dos Bolsonaros sobre patriotismo e utilizando contra eles mesmos”, esclarece Zimmermann.
O professor da USP ressalta que o PT conseguiu inverter o discurso bolsonarista, passando a mensagem de que “ser patriota é desejar o melhor para o Brasil e não se submeter a governos estrangeiros”.
Para João Feres, cientista político do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da UERJ, a estratégia adotada pelo PT é previsível, já que o bolsonarismo se colocou em uma armadilha ao alinhar-se aos interesses de Donald Trump.
“O discurso nacionalista do bolsonarismo é extremamente superficial. Agora, então, ele ficou contraditório, pois as medidas de Trump prejudicam o país como um todo. Para piorar, prejudicam ainda mais setores do agronegócio exportador que tão ardorosamente apoiaram Bolsonaro”, enfatiza Feres.
“Nós contra eles”
Rodrigo Prando, cientista político e professor de Sociologia na Universidade Presbiteriana Mackenzie, avalia que o governo Lula ganha um novo fôlego com essa campanha de confronto. Ele destaca que o uso da inteligência artificial (IA) na construção da estratégia “nós contra eles” busca resgatar símbolos do patriotismo, invertendo a lógica promovida pelo bolsonarismo.
“A força do conservadorismo, do reacionarismo, da extrema direita, muitas vezes conjugadas no bojo do bolsonarismo, monopolizou o patriotismo, monopolizou a bandeira nacional, monopolizou a camisa da Seleção Brasileira. Este episódio do tarifaço pode, sim, deslocar o patriotismo para o campo da esquerda e dos progressistas”, pontua Prando.