A aliança entre o conservadorismo político de Jair Bolsonaro (PL) e o liberalismo econômico representado por Paulo Guedes foi determinante para a vitória nas eleições de 2018, mas a relação entre os dois esfriou, principalmente após o término do governo em 2022.
No campo da oposição, o bolsonarismo mais radical se afastou de pautas tradicionais do mercado, como ajuste fiscal e privatizações. Políticos próximos a Bolsonaro também passaram a criticar a influência da Faria Lima, e agora, com o lançamento de Flávio Bolsonaro como candidato à Presidência, o mercado demonstra receio e até articula para que partidos do Centrão não se alinhem ao projeto do PL.
O candidato ao Planalto que conta com maior apoio do mercado continua sendo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro de Bolsonaro e considerado leal ao ex-presidente. Agentes financeiros pressionaram para que Bolsonaro abençoasse Tarcísio como candidato, e, caso isso não fosse possível, o nome de reserva seria o do governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD).
Em relação a Flávio Bolsonaro, o mercado mantém cautela, refletida no recuo da Bolsa e na valorização do dólar desde o anúncio de sua candidatura. A apreensão se dá não apenas pelo receio de quatro anos adicionais de Lula, mas também pela desconfiança sobre as convicções fiscais do filho mais velho do ex-presidente.
O senador Flávio Bolsonaro, por sua vez, minimizou as preocupações do mercado, afirmando à imprensa que os sinais econômicos negativos seriam mais uma forma de demonstrar inquietação com a possibilidade de mais um governo Lula do que uma avaliação concreta sobre sua política econômica.
O que tem acontecido
Na oposição, políticos e influenciadores digitais ligados ao bolsonarismo passaram a se distanciar da defesa do livre mercado e das reformas estruturantes. Eles criticaram privatizações, como a da Eletrobras, e se aproximaram de visões econômicas mais nacionalistas, dialogando com figuras associadas à esquerda, como os ex-ministros Aldo Rebelo e Ciro Gomes.
A resistência do mercado ao nome de Flávio Bolsonaro não tem levado seus aliados a tentar reconstruir pontes, mas a intensificar críticas. Nesta semana, o vereador Carlos Bolsonaro (PL-SP) utilizou as redes sociais para atacar a chamada “Faria Luler”, acusando-a de se apresentar como elite esclarecida, mas, segundo ele, ser “o maior obstáculo ao desenvolvimento nacional”.
Para os bolsonaristas mais ideológicos, o mercado ignora a venda de ativos estratégicos, incluindo estatais como a Petrobras, para países considerados adversários estratégicos, como a China. Essa percepção reforça a narrativa de nacionalismo econômico dentro do grupo.
O discurso de reindustrialização de Donald Trump nos Estados Unidos também serve como referência e inspiração para o bolsonarismo, dando sustentação à guinada nacionalista em relação à economia.
Com essa linha de atuação, os bolsonaristas buscam se diferenciar da política econômica liberal tradicional e construir uma identidade própria, que privilegia a soberania nacional e questiona alianças com interesses internacionais considerados conflitantes.
Analistas também não veem chance de Flávio contra Lula
Analistas da Faria Lima não enxergam em Flávio Bolsonaro alguém capaz de implementar grandes reformas ou priorizar o equilíbrio fiscal em detrimento do populismo. Além disso, questionam a possibilidade de o filho mais velho de Bolsonaro derrotar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas próximas eleições. Para esses especialistas, a perspectiva de um quarto mandato de Lula justifica o pessimismo fiscal, a queda da Bolsa e a alta do dólar.
Pesquisas recentes, como a divulgada pelo Datafolha nesta semana, reforçam essa avaliação. O levantamento indicou que apenas 8% dos eleitores apoiavam a escolha de Flávio como sucessor de Bolsonaro, mostrando baixa aceitação popular para o cenário proposto pelo ex-presidente.
Outros nomes aparecem mais bem posicionados na mesma sondagem. A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro conta com 22% das preferências, enquanto Tarcísio de Freitas aparece com 20%. Curiosamente, Flávio Bolsonaro ficou atrás do irmão, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), em termos de intenção de voto.
A aversão do mercado ao nome de Flávio também é refletida nas redes e publicações de influenciadores digitais da Faria Lima. Eles criticam a indicação, insistem na candidatura de Tarcísio e até ameaçam optar pelo voto nulo ou apoiar Lula caso o cenário atual se mantenha.
Esse clima de desconfiança evidencia que, mesmo dentro da base bolsonarista, a escolha de Flávio ainda gera dúvidas sobre viabilidade política e econômica, afetando a percepção de investidores e analistas do mercado financeiro.


