Um estudo americano publicado na última quarta-feira (22) na revista Nature revelou que vacinas de mRNA contra a Covid-19 podem “reprogramar” o sistema imunológico e tornar pacientes com câncer mais responsivos à imunoterapia. A pesquisa observou que pessoas vacinadas dentro de um período de 100 dias antes ou depois do início do tratamento com inibidores de pontos de verificação imunológicos apresentaram maior sobrevida global em comparação às não vacinadas nesse intervalo.
De forma simplificada, o sistema imunológico atua reconhecendo e eliminando agentes estranhos, como vírus ou células tumorais. O câncer, porém, costuma escapar dessas defesas, enganando o organismo e se multiplicando livremente. A imunoterapia tenta corrigir esse desequilíbrio, ensinando o corpo a identificar e atacar as células malignas.
Mesmo assim, alguns tumores chamados de “frios”, por apresentarem pouca resposta imune prévia, tendem a resistir a esse tipo de tratamento. O estudo indica que as vacinas de mRNA funcionam como um “sinal de alarme”, ativando uma resposta de interferon tipo I, estimulando células apresentadoras de antígenos e impulsionando a ação de linfócitos CD8+, fundamentais para destruir células tumorais.
Na prática, isso significa que a vacina não combate diretamente o câncer, mas “acorda” o sistema imune, preparando-o para reagir de forma mais eficiente à imunoterapia. Nos experimentos, pacientes com câncer de pulmão que receberam a vacina no período de 100 dias tiveram sobrevida média de 37 meses, contra 20 meses entre os que não foram vacinados. Os melhores resultados foram observados em indivíduos com tumores menores ou com baixa atividade imune inicial.
Segundo os pesquisadores, se os achados forem confirmados por ensaios clínicos randomizados, as vacinas de mRNA já disponíveis comercialmente poderão ser incorporadas como parte do tratamento padrão em conjunto com a imunoterapia.
Apesar do otimismo, os autores ressaltam que o estudo é retrospectivo e envolve múltiplas variáveis de controle, o que exige cautela antes de estabelecer uma relação causal definitiva. Ainda assim, a descoberta abre uma nova fronteira na medicina, sugerindo que vacinas originalmente criadas para prevenir infecções virais podem se tornar aliadas no combate ao câncer.


